Uma das minhas queridas primas, tem quase a mesma idade que eu, nossos filhos também tem idades próximas. Não nos vemos com a frequência que gostaria porém sempre temos muitos assuntos e afinidade para tricotar.
Nos tornamos mães pertinho e ansiamos sobrinhos juntas. Nossos irmãos nos deram essa herança na mesma época também.
Muito bom poder partilhar tantas descobertas com alguém a quem quer nosso bem e que amamos reciprocamente.
Em uma de nossas conversas, logo que nos tornamos titias, Dani me perguntou o que eu estava achando sobre a experiência. Sem podar a resposta, pude ser franca e respondi que estava frustrada.
Ser tia é bom, é maravilhoso. Porém não gostei. Não me senti confortável, não me sinto realizada, não me sinto útil. É superficial. Não é intenso. De certa forma, dispensável.
Como pode a gente amar um serzinho como se fosse nosso filho e não poder embarcar 100% nessa aventura dura e deliciosa!?
Amo de doer, de faltar meu ar, de dar a vida por ele mas não sei se esta alimentado, como dormiu, se tomou banho, se o pediatra está em dia, seu brinquedo favorito da vez, seus gostos e suas descobertas diárias. Não vi sua carinha ao nascer, seu primeiro cocô, suas cólicas, suas tentativas de mamada, seu primeiro sorriso, quando firmou a cabecinha, suas primeiras comidinhas, quando sentou, primeiros passos, cada palavra que aprende todo dia.
Por mais que o veja com frequência, tenho que manter certa distancia, nunca ultrapassando o espaço dos pais dele.
Pode ser porque a maternidade chegou aqui primeiro. Se o sobrinho tivesse vindo antes, talvez todo o sentimento fosse diferente.
Talvez se os pais dos meus filhos tivessem feito a parte deles e não somente tivessem me "ajudado" quando convinha, eu teria um outro olhar.
Hoje, depois de tantos anos maternando, sobrevivendo a esse limbo que a maternagem solo nos proporciona, me pego invertendo os papéis. Me sentindo pai. Que me frustra muito mais do que sendo tia.
Minha primogênita ha pouco foi morar com o pai. Fato que penso nunca poder superar. As circunstancias caminharam para isso, guardei minha emoção e a razão diz que devo seguir o fluxo e aguardar o tempo cumprir seu papel.
Ela ficou um mês morando lá. Chegou férias escolares e então ela passou um mês cá. Escrevo enquanto volto da rodoviária. Ela voltando para lá. Eu ao meu ninho 1/3 vazio. Com um pedaço do coração faltando.
Quando ela chegou, a alegria de tê-la de volta, dividiu espaço com a culpa. A culpa de sempre, só que aumentada e multiplicada. Passei uns três dias melancólica até que decidi viver um dia de cada vez, aproveitar os momentos juntas, pisar nos instintos, calar muitos nãos, evitar conflitos. Sim, esses conflitos necessários para educar. Os aqui de dentro continuaram, ainda mais atenuados. Abaixei o volume e fingi demência.
Algumas vezes fui a vó que troca agradinhos culinários ou disciplinares por afeto.
Muitas vezes fui o pai.
Aquele que deixa para a mãe educar depois quando ele não estiver mais por perto.
Aquele que quer compensar ausência com bens materiais.
Aquele dos passeios maneiros que desinteram as contas do mês seguinte.
Durante um mês fui um barquinho livre guiado pela maré.
Foi bom porque foi passageiro.
Nesse momento, todos aqueles delírios recorrentes sobre quem eu sou, de onde vim, para onde vou, missão, utilidade… Me dizem para vestir novamente minha armadura de mãe. Voltar a ser mãe. Que deve ser para isso mesmo que eu nasci.