Quadrinho feito com feltro e bastidor de madeira.
Inspirem-se! (ˆ◡ˆ)♥
Não consigo lembrar onde ouvi, ou li, mas a frase me fez explodir a cabeça e desde então fica ressoando todo dia, o tempo todo.
“Meus pais sempre me falam que eu não fui planejado, que eu não deveria ter nascido. E deve ser esse o motivo por eu nunca ter me sentido em casa nesse mundo. Sou aquela visita indesejada. Sou o intruso. Eu não deveria viver aqui nesse planeta.”
E pra mim fez tanto sentido pois é exatamente o que sinto. Como sempre me senti. O que sempre ouvi. Que ouço até hoje. Sem sutileza, sem compaixão. Dói. Rasga. Sangra. É aquela ferida que nunca cicatriza. E quando parece que há cicatriz, a pele abre novamente, revira toda a carne e fica inflamado, infeccionado, putrificado.
Se o assunto surgir todo dia, todo dia minha mãe confirma. Meu irmão nunca imaginou que essa “brincadeira” pudesse doer por que nele nunca doeu. E ele adora relembrar, reafirmar, desdenhar. Na frente do meu pai, jamais, mas ele também tinha muitos fantasmas e um grande abismo entre nós.
Isso me fere principalmente depois de me tornar mãe. Nunca faria isso com um irmão, menos ainda com um filho. Sou totalmente a favor do aborto apesar de imaginar que nunca faria. Nunca me passou pela cabeça. Fui mãe solo, adolescente. É de uma insanidade sem limite. Absurdamente insano. Intensamente insano. Nem por um segundo achei que minha filha foi um erro. Nunca! Nunca sequer fiz referencia. Me dói imaginar que possa alguma vez ter passado isso pela cabeça dela ou dos outros dois filhos. Me tranquiliza saber o que sinto, o que sempre senti. Reafirmar a valia deles e o amor, fundamental!
Soma-se o não pertencimento ao seio familiar com os relacionamentos fracassados, bingo! Minha inadequação e inabilidade social… Nunca me senti parte desse mundo!
Eu quero descobrir quantas cores tem seus olhos.
Eu quero massagear o seu rosto até a ruguinha apreensiva do meio da sua testa desaparecer.
Eu quero entrelaçar os meus dedos na sua barba.
Eu quero a conchinha por trás para cheirar o seu cangote.
Eu quero contar quantos palmos que tem as suas costas.
Eu quero fazer carinho na sua panturrilha com o meu pé.
Eu quero contar as pintinhas da sua barriga.
Eu quero saber quais são seus livros, séries, filmes e músicas favoritas.
Eu quero ouvir você listando todas as cidades que quer conhecer e os países que quer morar.
Eu quero sentar no meio fio com você e virar a noite conversando.
Eu só queria que você me quisesse…
Eu tenho sentimentos ambivalentes muito conflitantes sobre aniversários. No do ano passado, eu sabia que era o último. Tinha planos, metas e certezas. Esse, tenho ressignificado tanta coisa, que me convenci experimentar deixar fluir. Como diz na canção do Iron: RUN, LIVE TO FLY, FLY TO LIVE, DO OR DIE!
Todas as minhas lembranças de infância são ruins. Todas! As vezes eu cavo, cavo, cavo. Busco nas minhas profundezas, algo de bom, algo que aqueça o coração. Quanto mais eu lembro, mais dói. Então eu recuo, enterro novamente e desisto. Com aniversário, não é diferente.
A memória de aniversários até uns onze ou doze anos (não sei direito, não tem registro, não tem foto), é do café da manhã na padaria. Era somente eu, meu irmão e meu pai. Mãe nunca se importou. Era a melhor refeição do ano. Único momento em que eu me sentia gente. Eu podia escolher o que comer e o que beber. Eles acompanhavam. No do meu irmão, a mesma coisa. Ele escolhia e a gente acompanhava. Sempre na mesma padaria. Eram os melhores minutos do ano. O tempo parava ali. Normalmente escolhia misto quente com guaraná. A gente não saia nunca. Esse era “o” passeio! A gente também passava muito aperto e esse era o auge do luxo, a experiência gastronômica perfeita.
Só que mesmo a melhor memória, não esconde o que tinha por volta. Os dias antes eram de muita ansiedade. A gente torcia muito para o pai não beber. Sabia o inferno que era o dia que ele bebia. E ele bebia todos os dias. Ele também tinha epilepsia. Ou ele estava bêbado, ou ele tinha incontáveis ataques no dia. Não tomava medicação porque não poderia beber álcool. Um ciclo intenso e sem fim. Enquanto éramos crianças, ele conseguiu ficar sóbrio nas manhãs dos nossos aniversários a tempo de nos levar na padaria. Só que nunca conseguia voltar sóbrio da padaria conosco. Não conseguia finalizar a refeição sem pedir a branquinha. A gente via nitidamente o conflito dele. E voltávamos para casa tristes, com as lágrimas silenciosas, abraços nulos e afeto zero. Mais tarde o pai chegava com todas as outras dificuldades e a vida real rasgava todas as ilusões de pertencimento, de se sentir especial, de poder ser feliz.
Outro ponto importante é que nos anos 80 e 90 não tínhamos internet, nem mesmo telefone. Nunca tive muitas amizades. E minha mãe faz aniversário um dia depois de mim. Eu sempre recebi parabéns no dia seguinte porque as pessoas deixavam juntar e aproveitar a viagem. Mais ainda, meu irmão faz quinze dias depois. Então a outra metade; eu recebia nesse dia.
Conforme fui crescendo, pouca coisa mudou. Melhorou com as redes sociais. Eu que nunca soube lidar direito. Será que estão lembrando de mim porque sou importante para elas ou estão automaticamente respondendo a notificação do aplicativo!? Meu ex marido costumava comprar um bolo para mim. Era ótimo. Intimista. No último ano que estivemos juntos, ele comprou também. Só que a gente estava separando. Não estávamos conversando direito. Na noite anterior ele nem dormiu em casa, nem teve bom dia, nem olhou na minha cara no almoço… A noite um bolo. Foi bem esquisito. Essa coisa de esperar o ano todo por um único dia. É insano! Não quero nesse dia o que não tenho nos outros. Ontem, eram onze horas, estava cozinhando (sim, faço almoço cedo), minha mãe levantou (sim, ela acorda tarde), como de costume, dividimos a cozinha sem uma palavra, sem cruzar o olhar. Então sendo aniversário, terá um sorriso e um abraço. Essa parte eu odeio! Eu sequer costumo dar presente nesse dia. Prefiro presentes avulsos em dias comuns. Presentes inesperados. Momentos, lembranças, conexões. Claro que é gostoso ganhar presente! Toda minha infância foi sem presente. Minhas tias faziam bolinho para mim. Dividia com a mãe. Era muito gostoso. Nos últimos anos também ganhei bastante carinho de gente que amo. É maravilhoso! Sempre mantendo a máxima do “não esperar para não se frustrar”. Que é bem triste, convenhamos.
Um estalo que me fez repensar a vida toda foi o dia que enterrei meu pai. Nunca me senti tão sozinha. Percebi que não tenho uma rede minha. Tudo que construí foi pelos outros. Pela família que tentei criar. Já estava em crise com o marido. Ele pouco esteve ao meu lado. Não tinha nenhuma amiga ali. Tinha toda a família, foi essencial! Mas todos ali estavam chorando, cada qual, sua própria dor. Eu não tive ninguém para chorar minha dor comigo. Meu irmão recebeu vários amigos. Minha mãe recebeu vários amigos. Meus familiares receberam seus amigos. Eu estive sozinha.
Outro dia numa conversa, me perguntaram o porquê de eu não beber. Respondi que pelo histórico do meu pai e pelas crianças. Que elas já não tem pai presente, que eu sou sozinha e sou tudo que elas tem. Elas precisam de mim alerta cem por cento! Não posso relaxar. Recentemente tive uma crise de labirintite, fiquei muito ruim, continuei dando conta de tudo de modo sobrenatural. Até que desabei. Precisei tomar uma medicação forte que me apagou. Eu nem sei se alguma outra vez eu dormi tão bem, acho que nunca. Acordei renovada. Foi bom só até saber que meu caçula passou mau a noite e a mais velha que o socorreu. Fique ruim em dobro com o peso da minha falta com um e com a carga que ficou na outra. Mãe não tem paz nem para ficar doente. Muito menos para morrer. Quem vai cuidar? Ninguém vai usar o “incondicionalmente” como eu. E o que será da cabecinha deles? Poderão aguentar isso da mãe? Como garantir que não sentirão culpa apesar de não terem.
Eu poderia dizer que vivia no piloto automático. Mas bem pior que isso. Eu sempre vivi por obrigação (não vou estender esse ponto pois daria mais 3 capítulos, no mínimo!). Quando chegou a pandemia, depois do susto me veio um alivio esperançoso secreto. Senti que teria a chance de partir, quietinha, sozinha e com um bom álibi. Só que o sentimento foi substituído pelo pânico de não ser eu. De eu perder alguém que amo. Eu não suportaria viver tendo perdido um filho. E ai eu pirei! Senti a pandemia da pior forma possível. Muito pesado e solitário, como foi para muita gente…
Em outra conversa, um amigo contou que via sua mãe não como uma pessoa, sim como um espectro. Ela sempre estava presente, sempre ali para eles porém nunca estava realmente ali. Isso me atravessou de uma forma dolorosa. Percebi que era assim que minha filha sempre me viu. E sempre tentou me alertar mas eu nunca pude escutar. A pressão da vida adulta, das responsabilidades, da maternagem, cegam qualquer pessoas. E se você não tem apoio, você sucumbe.
No ano passado minha filha completou dezoito anos e isso foi um outro grande divisor de águas para mim. Como se a maioridade dela, me libertasse para voltar a ser eu, por mim. Mesmo com os meus filhos ainda criança. Era como se eu tivesse passado de fase. E pudesse respirar. A sobrecarga da maternagem solo é uma coisa imensurável. Cruel ao extremo! Eu me vi podendo pensar em mim. Eu desamarrei minha mãe das minhas costas também. Eu agora só tenho nas asas dois filhos. Sem marido, sem mãe, sem filha mais velha. Continuo disponível só que agora com poder de escolha em me colocar no podium as vezes.
Há um ano eu estava muito destruída. Noites e mais noites em claro; incontáveis crises de pânico e ansiedade. As noites eram desesperadoras e pela manhã eu fingia estar tudo bem. Colocava minha capa de mãe e seguia. Por dentro tudo estragado. Comia as unhas até sangrar. Me fechava para as pessoas pois achava que já tinha tido minhas oportunidades de relacionamento e que para o resto da existência, deveria aceitar a rejeição. Cumprir a missão de criar os filhos. E quem sabe um dia poder partir. Porque é certo que eles irão. Irão desbravar o mundo, irão viver suas próprias vidas, seus próprios desejos e ambições. E se hoje que apenas um filho voou, já não sei o que resta de mim, imagina quando forem os três. É o natural e é inevitável. O cérebro entende. O coração…
Eu não olhava para o céu. Achava normal, achava que amanhã tem igual de novo. Bobagem. Ha alguns meses eu comecei olhar para o céu. Comecei ver beleza ali. Comecei admirar e me encantar com cada detalhe. Eu virei a pessoa obcecada pelo céu. Apaixonada. Tenho dependência de ficar observando todo dia. Meu olhar mudou para muita coisa. Abri as portas do meu casulo. Tenho saído para respirar com frequência. Tenho necessidade de conversar sem o assunto ser filho. Voltei me enxergar como mulher, como pessoa. Eu nem estou saindo mais dos grupos do WhatsApp, estou respondendo todo mundo em poucas horas, não mais em dias, semanas. Deus está vendo o quanto tenho me esforçado para socializar! Parei de dizer aquele não automático para tudo. Disse mais sim nos últimos meses do que na vida toda. Ainda sou bem malvada comigo porém sempre paro para refletir depois e até já aprendi me pedir desculpas.
Dizer sim para a vida, não faz ela ser fácil. Faz ser menos dolorosa. Continuo quebrando a cara periodicamente mas o que compensa é que tenho me recuperado mais rapidamente e com menores sequelas. Nem sempre, é verdade! O mínimo que for, já é lucro! Agora ver o que me espera nos 37. Para o dia, pela primeira vez, planejei algumas coisinhas que eu gosto de fazer com a minha doce companhia. Nem vou falar em voz alta para o universo não ter chance de puxar o tapete.
Estou pronta! Bora!?
Envelope de coelhinho de origami (EU SEI QUE ORIGAMI NÃO USA TESOURA E COLA MAS EU QUERO CHAMAR MINHA DOBRADURA DE PAPEL DE ORIGAMI, ME DEIXA!). Fiz com papel espelho, 1 quadrado de 20X20cm. Poder ser com qualquer tipo de papel e de qualquer tamanho desde que seja um quadrado com as medidas iguais.
Inspirem-se! (ˆ◡ˆ)♥